REVOLUÇÃO HUMANA

"A grandiosa Revolução Humana de uma única pessoa irá um dia impulsionar o destino total de um país, além disto, será capaz de transformar o destino de toda a humanidade."





Daisaku Ikeda







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segunda-feira, 7 de outubro de 2013

"Ser Humano: essência da ética, da medicina e da espiritualidade" (por Daisaku Ikeda)

Fragmento do diálogo entre Dr. Daisaku Ikeda e Dr. Guy Bourgeault, extraído do livro "Ser Humano: essência da ética, da medicina e da espiritualidade" (Editora Brasil Seikyo, 2007, pp. 120 -121):

Ikeda: No outono de 1997, tive a imensa boa sorte de conhecer o dr. Linus Pauling Jr. (1925), psiquiatra em exerício no Havaí. O dr. Pauling me disse que, embora os casos de distúrbios mentais graves não estejam aumentando, um número cada vez maior de pessoas está se sentindo incapaz de se adaptar nos meios social, profissional e familiar.

Bourgeault: Nossa sociedade não facilita a integração de pessoas com distúrbios mentais. Para sermos considerados aptos na sociedade atual, para trabalhar e participar da vida social, temos de dominar conceitos abstratos e códigos complexos. Mesmo as pessoas de qualidades notáveis e habilidades diversas podem ser marginalizadas.

Ikeda: Para que a sociedade se desenvolva de maneira plena é necessário que aceitemos e façamos uso de todos os tipos de individualidades, habilidades e qualidades humanas.

Bourgeault: Com certeza. As pessoas sobre as quais falei possuem muitos talentos! Porém, as capacidades de amar, de sofrer, de sorrir e de demonstrar solidariedade são dificilmente valorizadas na sociedade pragmática de hoje, uma sociedade competitiva.

Ikeda: Sim, concordo com o senhor. O dr. Pauling e eu conversamos sobre vários aspectos da relação humana, inclusive o relacioamento de pais e filhos e de professor e aluno. Compartilhei com ele o conceito budista de quatro tipos de relacionamento pessoal chamado shi-shobo em japonês.

Bourgeault: O que isso quer dizer?

Ikeda: Refre-se às quatro maneiras de fortalecer a capacidade de realizar o bem, evitar o mal e seguir o Caminho do Meio. A primeira é a caridade, tanto material como espiritual, que alivia a angústia da outra pessoa e transmite coragem. A segunda é expressar-se com palavas gentis, ou de forma compassiva e atenciosa. A terceira é beneficiar os outros com bons pensamentos, boas palavras e boas ações, ou seja, compreender o verdadeiro sentimento dos outros. A quarta é identificar-se com as outras pessoas, o que significa agir e compartilhar pensando sempre no coletivo. Parece-me que a habilidade de se relacionar com os outros dessas quatro maneiras está se tornando cada vez mais importante na nossa sociedade altamente tecnológica e industrial. 

É isso ai!

domingo, 22 de setembro de 2013

Resguardar a Felicidade Eterna da Humanidade

MARCOS ROBERTO DOS SANTOS[1]
Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP
lotusmappo@ig.com.br

Resumo
Neste artigo está sendo apresentado Daisaku Ikeda, líder religioso, praticante ativo do budismo Nitiren, sábio japonês que viveu no século XIII. Lutador incansável dos Direitos Humanos, bem como da abolição das armas nucleares, Ikeda herda o espírito de seu mestre, Jossei Toda (1900 – 1958), o qual, após se tornar segundo presidente da Soka Gakkai (1951), lança como meta “acabar com a miséria da face da Terra”. Ikeda defende a teoria da Revolução Humana, ou mudança interior, acreditando assim que para produzir os indivíduos e uma sociedade na qual o altruísmo seja o espírito dominante, seja necessária uma revolução interior na vida de cada pessoa. Em muitos de seus escritos é apontado que a tendência moderna é a de os agregados de seres humanos se voltarem para a insensatez, à ignorância de seus direitos, e a busca irresponsável do prazer. Publicou diálogo com personalidades mundiais abrangendo temas diversos, Direitos Humanos, Religião, Sociedade, Filosofia, Astronomia, entre outros. Neste artigo inicialmente é apresentado o diálogo entre Austregésilo de Athayde, presidente da Academia Brasileira de Letras (ABL) e Daisaku Ikeda, filósofo e poeta. Os tópicos constantes do diálogo constituem questões de interesse pessoal de seus participantes, no caso Direitos Humanos. Assunto este discutido pelos seres humanos desde os remotos tempos. Daisaku Ikeda é um homem do extremo oriente; Austregésilo de Athayde representa o mundo ocidental. Quando do encontro entre ambos Athayde manifestou ter esperado sua vida toda por este encontro.


Palavras-chave: Direitos Humanos – Paz – Revolução Humana


Abstract
This article is being presented Daisaku Ikeda, religious leader, active practitioner of Buddhism Nichiren, Japanese sage who lived in the thirteenth century in Japan tireless fighter for Human Rights as well as the abolition of nuclear weapons, Ikeda inherits the spirit of his master, Josei Toda (1900 - 1958), who, after becoming the second president of the Soka Gakkai (1951), cast as a goal "to end the misery on earth." Ikeda advocates the theory of Human Revolution, or inner change, believing so to produce individuals and a society in which altruism is the dominant spirit, inner revolution is needed in the life of every person. In many of his writings is pointed out that the modern trend is to the aggregate of human beings turn to folly, ignorance of their rights, and the reckless pursuit of pleasure. Published dialogue with world figures covering various topics, Human Rights, Religion, Society, Philosophy, Astronomy, among others. This paper initially presents the dialogue between Austregésilo de Athayde, president of the Brazilian Academy of Letters (BAL) and Daisaku Ikeda, philosopher and poet. The topics contained in the dialogue are issues of personal interest of its participants, in the case of Human Rights. This issue discussed by humans since ancient times. Daisaku Ikeda is a man from the far east; Austregésilo de Athayde represents the western world. When the meeting between both expressed Athayde have expected his lifetime for this meeting.



Keywords: Human Rights - Peace - Human Revolution


Resumen
En este artículo se presenta Daisaku Ikeda, líder religioso, practicante activo del budismo de Nichiren, sabio japonés que vivió en el siglo XIII en Japón incansable luchador por los Derechos Humanos, así como la abolición de las armas nucleares, Ikeda hereda el espíritu de su maestro, Josei Toda (1900 - 1958), quien, tras convertirse en el segundo presidente de la Soka Gakkai (1951), elegido como un objetivo "poner fin a la miseria en la tierra." Ikeda aboga por la teoría de la revolución humana o cambio interior, creyendo así que para producir individuos y una sociedad en la que el altruismo es el espíritu dominante, es necesaria revolución interna en la vida de cada persona. En muchos de sus escritos se señaló que la tendencia moderna es el conjunto de los seres humanos a su vez a la locura, la ignorancia de sus derechos y la búsqueda temeraria de placer. Publicado diálogos con figuras mundiales que abarcan diversos temas, Derechos Humanos, Religión, Sociedad, Filosofía, Astronomía, entre otros. Este trabajo presenta inicialmente el diálogo entre Austregésilo de Athayde, presidente de la Academia Brasileña de Letras (ABL) y Daisaku Ikeda, filósofo y poeta. Los temas contenidos en el diálogo son los temas de interés personal de sus participantes, en el caso de los Derechos Humanos. Este tema discutido por los seres humanos desde tiempos remotos. Daisaku Ikeda es un hombre del lejano oriente; Austregésilo de Athayde representa el mundo occidental. Cuando el encuentro entre ambos Athayde expresado haber esperado toda su vida para esta reunión.



Palabras clave: Derechos Humanos - Paz - Revolución Humana



“Ambos almejamos, com toda a força dos nossos corações e mentes, que o dia de amanhã seja o da igualdade entre todos os homens e mulheres, sem distinção de qualquer natureza. Um amanhã em que possam desfrutar dessa igualdade sem receios, livres dos preconceitos, podendo alcançar a felicidade pessoal num mundo em que todos os credos com seus cultos sejam respeitados e as liberdades básicas asseguradas nos princípios básicos da Declaração Universal dos Direitos Humanos”.
(Austregésilo de Athayde)
Encontro de Gigantes
Sendo iniciado por “ambos” no fragmento citado acima se refere a duas personalidades importantes no assunto Direitos Humanos. Austregésilo de Athayde e Daisaku Ikeda. Ele, brasileiro, jornalista, presidiu a Academia Brasileira de Letras até sua morte em 1993, o outro, japonês, filósofo, economista, budista e Presidente da Soka Gakkai Internacional - SGI, esta uma das maiores organizações não governamentais das Nações Unidas, com mais de 13 milhões de associados em 192 países e territórios.
Além destes atributos podemos citar outros reconhecidos à Ikeda que são “poeta laureado” e “escritor”, com obras traduzidas para mais de vinte línguas. Ikeda ocupa a cadeira de número 14 da Academia Brasileira de Letras.
Entre seus esforços para corresponder com as Nações Unidas está o de apresentar anualmente, no dia 26 de janeiro, aniversário de fundação da SGI, sua Proposta de Paz. É comum se direcionar a SGI dizendo que esta é a fortaleza da paz e dos Direitos Humanos e que é um jardim de flores para a revitalização das pessoas.
É combatente feroz das armas nucleares. Almeja que as armas nucleares não sejam utilizadas em ataques reais, e que os processos de sua produção, testes e armazenamento afetam gravemente a vida dos seres humanos e do meio ambiente.
Em sua Proposta de Paz apresentada em 2012 Ikeda comenta
“A luta pela paz, assim como pelos direitos humanos e pela humanidade, não é aquela em que, atingido o pico da montanha, o objetivo final é conquistado. Pelo contrário, é um trabalho que gera um fluxo ininterrupto e imparável de comprometimentos interligados e que passa de uma geração a outra. Esta é a convicção que sustenta nossos esforços para ajudar a construir um futuro melhor para todos”. (IKEDA, 2012, p. 21)

Como um admirador dos esforços e empenho de Daisaku Ikeda por difundir um mundo de paz Athayde (2000, p. 59) tece os seguintes comentários sobre este nobre pensador oriental incluindo-o entre alguns próceres do humanismo:
“Certos homens merecem, por excelência, o destaque que indica a corrente perpétua dos que lutaram pelos direitos humanos: Nelson Mandela, Mahatma Gandhi e Martin Luther King. São pessoas a seguir como exemplos de devotamento e coragem, que assumiram historicamente a responsabilidade da luta pelos direitos humanos. A eles quero acrescentar o nome de Daisaku Ikeda”. (ATHAYDE, 2000, p. 59-60)

Em questão a este reconhecimento à pessoa da Daisaku Ikeda, que comumente recebe várias homenagens ao redor do mundo, nos remete aos comentários de Hannah Arendt (2008, p. 10) quando diz:
“a homenagem não só nos lembra enfaticamente a gratidão que devemos ao mundo; também nos obriga a isso num grau altíssimo. Visto sempre podermos recusar a homenagem, ao aceitá-la não só fortalecemos em nossa posição no mundo, como também aceitamos uma espécie de compromisso em relação a ele”. (ARENDT, 2008, p. 10)

Ao que Ikeda diz que está disposto a esforçar-se ainda mais para poder corresponder às expectativas. Diz ainda que não se pode ser feliz e se sentir seguro individualmente, ignorando a miséria e as ameaças que afligem os outros.
Vale aqui citar reconhecimento atribuído à Daisaku Ikeda pelo grande poeta brasileiro Thiago de Mello (2001) que em partes diz que “com Daisaku Ikeda aprendi que a cidadania mundial, o espírito de tolerância e o respeito aos direitos humanos são a base da religião que há de mudar o mundo – a religião que construirá a vida do novo milênio. Porque ele nos ensina que só vale a pena trabalhar pelo sonho que cabe dentro da vida”. (MELLO, 2001, p. 6)

A Evolução dos Direitos Fundamentais do Homem
Sendo aprovada como primeira resolução pela Assembleia Geral das Nações Unidas, a proteção dos Direitos Humanos é o principal objetivo da Organização das Nações Unidas – ONU.
No livro Direitos Humanos no Século XXI, publicado no Brasil em 2000, trata-se de diálogo travado entre esses dois pensadores. Na apresentação Ikeda se refere a Athayde como “gigante na América do Sul” e Athayde dirige-se a Ikeda como “um profeta de alta inspiração de nossa atualidade”.
Diz ainda que
“Em nossos dias, Daisaku Ikeda é, sem dúvida, sem nenhuma intenção lisonjeira, um herdeiro de Aristóteles – o primeiro dos filósofos que deixou o plano do idealismo e passou a encarar os problemas com uma visão prática dos fenômenos naturais como se verifica em toda a sua grande obra”. (ATHAYDE, 2000, p. 17)

Referente à máxima do diálogo Vieira (2008, p. 142) resgata a importância dizendo que “já na Antiguidade clássica, nas bases estruturais do pensamento ocidental, Sócrates centrava a busca do conhecimento pelos diálogos, cuja matéria prima era o ato de perguntar”.
Em 1948, Austregésilo de Athayde participou, por ocasião da III Assembleia da Organização das Nações Unidas, da promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Sendo um dos delegados representantes do Brasil, Athayde colaborou ativamente da elaboração e da defesa desses direitos.
Por mais que sejamos pessimistas na evolução dos direitos fundamentais do homem, no diálogo travado entre esses dois gigantes é possível resgatar e resguardar uma majestosa condição de desenvolvimento, conforme podemos comprovar nas palavras “o ser humano caminhou para a igualdade combatendo a discriminação, aboliu a escravidão para conquistar a liberdade e está transformando o ódio em benevolência para finalmente abrir as portas para uma mudança”. (ATHAYDE, 2000, p. 11).
Em se tratando de Brasil, de fato, há muito a ser feito em defesa dos necessitados, quando o assunto são Direitos Humanos. Em 1986, a UNESCO edita a Declaração de Sevilha sobre a violência para refutar a ideia de que a violência humana é determinada biologicamente, desmente as visões de que os seres humanos teriam herdado a tendência para o comportamento violento, e que alguns diziam ser genético. Tema este tratado também por Ikeda (2013) em sua Proposta de Paz.
Esta situação está evidente no apontamento feito por Darcy Ribeiro (1995, p. 24) ao dizer que:
“Nesse plano, as relações de classes chegam a ser tão infranqueáveis que obliteram toda comunicação propriamente humana entre a massa do povo e a minoria privilegiada, que vê e a ignora, a trata e a maltrata, a explora e a deplora, como se esta fosse uma conduta natural”. (RIBEIRO, 1995, p. 24)

Em reconhecimento do resultado negativo que esta situação possa trazer ainda Darcy Ribeiro (1995, p. 25) afirma que “nessas condições de distanciamento social, a amargura provocada pela exacerbação do preconceito classista e pela consciência emergente da injustiça bem pode eclodir, amanhã, em convulsões anárquicas que conflagrem toda a sociedade”.
Aqui vale relembrar comentário feito por Lynn Hunt (2009, p. 17) que é autorreflexivo em questão da compreensão quanto à importância dos Direitos Humanos, como segue:
“Não devemos esquecer as restrições impostas aos direitos pelos homens do século XVIII, mas parar por aí, dando palmadinhas nas costas pelo nosso próprio “avanço” comparativo, é não compreender o principal. Como é que esses homens, vivendo em sociedades construídas sobre a escravidão, a subordinação e a subserviência aparentemente natural, chegaram a imaginar homens nada parecidos com eles, e em alguns casos também mulheres, como iguais? Como é que a igualdade de direitos se tornou uma verdade “autoevidente” em lugares tão improváveis? É espantoso que homens como Jefferson, um senhor de escravos, e Lafayette, um aristocrata, pudessem falar dessa forma dos direitos autoevidentes e inalienáveis de todos os homens. Se pudéssemos compreender como isso veio a acontecer, compreenderíamos melhor o que os direitos humanos significam para nós hoje em dia”. (HUNT, 2009, p. 17)

Em introdução de A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos, Comparato (2013, pg. 13) resgata de forma espetacular a história dos Direitos Humanos dizendo:
“a revelação de que todos os seres humanos, apesar das inúmeras diferenças biológicas e culturais que os distinguem entre si, merecem igual respeito, como únicos entes do mundo capazes de amar, descobrir a verdade e criar a beleza. É o reconhecimento universal de que, em razão dessa radical igualdade, ninguém – nenhum indivíduo, gênero, etnia, classe social, grupo religioso ou nação – pode afirmar-se superior aos demais”. (COMPARATO, 2013, p. 13)

Sendo um budista, Ikeda estimula a evolução da Humanidade e a criação de uma sociedade voltada para os Direitos Humanos, o que concorda também com as palavras de Comparato (2013, p. 16) quando diz que “a justificativa científica da dignidade humana sobrevejo com a descoberta do processo de evolução dos seres vivos”.
Como um pacifista Ikeda defende que a Declaração Universal dos Direitos Humanos não seja considerada como um conto de fadas. Para ele os Direitos Humanos são um tema básico que merece prioridade em tudo. Afirma que sem esses direitos não há como criar a paz nem estabelecer a felicidade. Dessa forma “é possível que o conceito de Direitos Humanos, que é a convicção da humanidade dotada de valor universal, venha a tornar-se o foco das atenções”. (IKEDA, 2010, p. 266)

A Revolução Humana
Para Ikeda a chave para a paz mundial está na mente humana. Muda-se o coração e a realidade exterior acompanha essa mudança. A teoria que defende é a da “Revolução Humana”. Conforme o líder da Soka Gakkai Internacional a Revolução Humana de cada indivíduo é um magnífico esforço para transformar o destino da humanidade. Ou seja, o ponto primordial da paz encontra-se no próprio ser humano.
Ainda citando Ikeda (1981, p. 191), quanto à importância da mudança interior, ou Revolução Humana de cada um, é afirmado que em questão da crise existente na sociedade se justifica da seguinte forma:
“... a crise da civilização contemporânea inicia-se bem no fundo de cada um de nós. Pode-se citar todos os tipos de razões políticas e sociais para o desenvolvimento de movimentos extremistas – fascismo, por exemplo – mas, na análise final, o fascismo é uma manifestação de desejos não reprimidos que é o demônio na vida das pessoas que são controladas pelo ego e pelo orgulho”. (IKEDA, 1981, p. 191)

Isto faz-nos entender que “seres humanos somente poderão mudar quando vencerem sua escuridão interior e resgatarem a dignidade eterna que possuem na própria vida”. (IKEDA, 2009, p. 23) O desbravar do ilimitado “poder da vida” inerente aos seres humanos transformará o “século de guerras” em “século de paz” – eis a “Revolução Humana”.
Em outro diálogo publicado entre Ikeda e Arnold Toynbee (1889 – 1975), famoso historiador britânico, intitulado de Escolha a Vida, em concordância entre ambos, Ikeda (1995) diz que “o coração humano, porém, invariavelmente abriga o ganancioso desejo de estabilizar e expandir os direitos e privilégios individuais, mesmo que a expensas dos seus semelhantes”. (IKEDA, 1995, p. 208)
Assim, Ikeda (1995, p. 212) ressalta que, melancolicamente, devemos admitir que é uma característica muito humana ser extremamente sensível à própria dor e sobremodo insensível à dor alheia. Concordando Toynbee (1995, p. 217) comenta que “o autodomínio é o único caminho para a felicidade, seja do indivíduo, seja de toda a humanidade”.
A filosofia da Revolução Humana defendida por Ikeda tem o significado traduzido em elevar o estado de vida, fazer a mudança interior. Sem a Revolução Humana, por mais que alguém acumule conquistas, seja na saúde, no amor ou no plano financeiro, continua o mesmo. “A mudança individual transforma o lar, a comunidade, a sociedade, o curso da história e o próprio mundo”. (IKEDA, 2013, p. 33)
Diz ainda que Revolução Humana não é virar um super-homem, é tornar-se um ser humano melhor, e complementa dizendo “o mundo jamais vai melhorar enquanto as pessoas – que são a força propulsora e o ímpeto de todos os empreendimentos – forem egoístas e insensíveis”. (IKEDA, 2013, p. 33)
Outra figura importante no mundo da astronomia que travou diálogo com Ikeda foi Ronaldo Rogério de Freitas Mourão (2009) que em parte tece comentário pertinente à teoria da Revolução Humana da seguinte forma: “A Revolução Humana de um único indivíduo promoverá a mudança na sua família, na sociedade em que vive e até no mundo inteiro. Partilho totalmente, ou melhor, comungo de modo ímpar com essa ideia”. (MOURÃO, 2009, p. 123)
A teoria da Revolução Humana contraria o dito popular que diz que “pau que nasce torto, morre torto”. Para maior entendimento vale citar trecho do romance Grande Sertão: Veredas de João Guimarães Rosa (2006), onde no início é descrito uma situação, pela personagem principal, relatando a transformação da “mandioca mansa” e da “mandioca brava” que ilustra perfeitamente o significado da Revolução Humana:
“... pois, num chão, e com igual formato de ramos e folhas, não dá a mandioca mansa, que se come comum, e a mandioca-brava, que mata? Agora, o senhor já viu um estranhez? A mandioca doce pode de repente virar azangada – motivos não sei; às vezes se diz que é por replantada no terreno sempre, com mudas seguidas, de manaíbas – vai em amargando, de tanto em tanto, de si mesma toma peçonhas. E, ora veja: a outra, a mandioca-brava, também é que às vezes pode ficar mansa, a esmo, de se comer sem nenhum mal”. (ROSA, 2006, p. 11)

Em meio a seus escritos Ikeda ficou conhecido por sua célebre frase que diz: “Seja como for, a grandiosa Revolução Humana de uma única pessoa impulsionará a mudança total do destino de um país, além disto, será capaz de transformar o destino de toda a humanidade”. (IKEDA, 2012, p. 34) Assim, o caminho da Revolução Humana encontra-se no ato de aprimorar-se a si próprio hoje mais do que ontem, amanhã mais do que hoje.

Luta contra a Discriminação
Para combater a injusta discriminação é necessário mudar o coração das pessoas. E para isto é importante uma reforma na vida dos seres humanos para transformar seu egoísmo que legitima o domínio sobre os outros, em humanismo pela coexistência pacífica. Ou seja, conforme defende Ikeda (1994, p. 116), não há outra solução a não ser por meio da Revolução Humana.
Defendendo o humanismo aplicado no Budismo Ikeda (2013, p. 36) comenta:
“O Budismo defende a dignidade da vida e revela a grandeza cósmica do ser humano. Não é uma religião de cerimônias, de práticas religiosas afastadas da realidade social. Também não se limita a oferecer explicações teóricas. Vai muito além. Estimula e dá meios concretos para cada pessoa, da forma como é, transformar a própria vida neste momento. O Budismo é a “religião da revolução humana”. (IKEDA, 2013, p. 36)

Combatendo a descriminação Ikeda (2000, p. 58) se utiliza de princípios budistas para analisar a profundeza em que predomina o apego ao ego que é chamado de consciência mano. Que nada mais é do que a coexistência dos quatro desejos mundanos que são: ignorância, preconceito, arrogância e amor-próprio.
Mais detalhadamente Ikeda (2000, p. 58) expõe estes princípios da seguinte forma:
“A ignorância refere-se à condição em que uma pessoa se fecha no pequeno mundo do seu ego perdendo completamente o sentido de relacionar-se francamente com outras pessoas abrindo o seu coração.
O preconceito é ter a ilusão de que esse ego fechado no seu pequeno mundo é propriamente o verdadeiro eu, e permanece apegado a ideias distorcidas, além de comparar a si próprio com os outros.
A arrogância é, mediante essa comparação, incorrer no sentimento de que é superior, igual ou não tão inferior aos outros. A arrogância sempre se caracteriza pela inveja e ambição de poder, domínio e riqueza, e leva as pessoas a perder o conceito de justiça e a cometer erros.
O amor-próprio é o apego encoberto por esses desejos mundanos. O amor aqui referido é a avidez pelo amor, é o amor-desejo, e indica todas as espécies de ambições miseráveis empregadas para a proteção de um ego menor”.  (IKEDA, 2000, p. 58)

Assim, é afirmado no Budismo que o sentimento de discriminação de raça, etnia, cultura e religião surgem desses quatro desejos mundanos. Ainda diz que o Budismo explica que a “escuridão fundamental da vida” é a origem primária desses impulsos negativos, como ira, avareza e estupidez, raízes venenosas da guerra e de outras calamidades.
Em questão a filosofia oriental Athayde (2000, p. 59) reconhece a importância do Budismo ao dizer “o Budismo se baseia, sem ser cerceado por nada, em um princípio comum a todos os homens – a justiça”. É perceptível o interesse a remoção de injustiças evidentes no mundo.
De acordo com esta questão Ikeda (2000, p. 59) vê “na sabedoria do Budismo uma grande possibilidade de evitar os conflitos que encobrem o nosso mundo motivado pela discriminação e de construir um futuro de convivência pacífica da raça humana”.
Assim, podemos perceber a importância de se manter o espírito de justiça e contestar o comportamento arrogante das pessoas. Tratando-se do tema “justiça” a razão deve prevalecer, conforme comenta Sen (2011, p. 35), Nobel em Economia, dizendo que “os requisitos de uma teoria da justiça incluem fazer com que a razão influencie o diagnóstico da justiça e da injustiça”.
Em Para Compreender a Ciência organizada por Andery (2003), já no capítulo 1 é comentado sobre “Os Trabalhos” de Hesíodo, escrito no ano VII a. C. em que aborda a concepção de Justiça da seguinte forma:
“Enquanto entre animais imperava o direito do mais forte, assumia que entre os homens imperava o direito de justiça. Para Hesíodo, essa era a distinção fundamental que marcava os homens e que devia ser buscada. O direito que assegurava a justiça era de todos os homens e, associado ao trabalho, os trazia de volta a uma ordem natural na qual era possível encontrar uma vida satisfatória e virtuosa”. (ANDERY, 2003, p. 28)

Assim, podemos dizer que a construção de uma sociedade real de paz e democracia, conforme Ikeda (1994, p. 28) defende, “não é conseguida por meio do radicalismo nem com uma revolução destrutiva”, e sim que “só pode ser concretizada pela ‘revolução da esperança’”, ou seja, pela “revolução humana que cultiva o grande solo da vida de cada ser humano”.
Em questão a educação em direitos humanos Ikeda (2000, p. 54) defende que é o meio para oferecer aos homens a mais perfeita formação como seres humanos. Diz ainda que “a educação é a força básica que constrói o futuro de cem ou duzentos anos”.

Conclusões
Neste ano em que se comemora os sessenta e cinco anos da Declaração, é um momento oportuno para reflexões do quanto as pessoas devem valorizar a vida, bem como a dignidade humana. Este grande líder, Daisaku Ikeda, que herdou diretamente de seu mestre, Jossei Toda, então segundo presidente da Soka Gakkai, promoveu uma grande batalha que consistia em erigir a fortaleza da paz no coração das pessoas extirpando as garras demoníacas que habitam a vida humana.
Confirmando o que Ikeda (2010) propõe só nos faz conscientizar que a urgência, neste momento, seria uma revolução consciente de uma humanidade que desperte conceito de Direitos Humanos em cada pessoa. Trata-se de uma revolução dentro do coração de cada um.
Nos ajuda a resgatar a convicção de que este é o momento para construir uma era de resplendor e glória da humanidade, focalizando, assim, a dignidade da vida. Precisamos nos empenhar na campanha por uma revolução interior, na qual todos participem e que contribuam com a paz e sejam capazes de mudarem o próprio indivíduo, para melhor.
Dessa forma só temos a concordar que o conceito de Revolução Humana, quando se atinge o âmago do ser humano, que é o sujeito da criatividade, transforma-se, a sociedade e o meio ambiente também alcançarão uma ampla reforma.
As violações e os abusos dos Direitos Humanos são uma trágica realidade em todos os lugares. Assim, conforme Ikeda (2013) aponta sua Proposta de Paz “para a criação de uma sociedade que respeite a vida, o sentimento de valor insubstituível de cada indivíduo deve desabrochar no coração de todos”.
Aqui no Brasil, a questão dos Direitos Humanos, é um processo contínuo que deriva já de sua descoberta. Sua dificuldade de aplicação na sociedade vem de tempos remotos conforme podemos perceber nas palavras de Darcy Ribeiro (1995) em O Povo Brasileiro quando diz que “subjacente à uniformidade cultural brasileira, esconde-se uma profunda distância social, gerada pelo tipo de estratificação que o próprio processo de formação nacional produziu”.
Conforme as próprias palavras de Ikeda (1994) em seu romance intitulado Nova Revolução Humana, no capítulo 1, Alvorecer, ele comenta que “não existe nada tão sublime quanto a paz. Não há nada mais feliz do que a paz. Paz – eis o primeiro passo fundamental no propósito do avanço da humanidade”.




Referências Bibliográficas
Livros
ANDERY, Maria Amália Pei Abib. Para compreender a ciência: uma perspectiva histórica. 12ª edição São Paulo: Educ, 2003. 436 p. Rio de Janeiro: Garamond.
ARENDT, Hannah. Homens em tempos sombrios. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. 315 p.
ATHAYDE, Austregésilo de; IKEDA, Daisaku. Diálogo: direitos humanos no Século XXI. 1ª edição Rio de Janeiro: Record, 2000. 276 p.
COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 8ª Edição São Paulo: Saraiva, 2013. 598 p.
HUNT, Lynn. A invenção dos direitos humanos: uma história. 1ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. 285 p. Tradução Rosaura Eichenberg.
IKEDA, Daisaku. Nova Revolução Humana. Volume 1. 1ª edição. São Paulo: Brasil Seikyo, 1994. 227 p.
______, Daisaku. Desafio de uma Nova Era: Paz. 1ª edição São Paulo: Brasil Seikyo, 2001. 208 p. Tradução, preparação e revisão Equipe Brasil Seikyo.
______, Daisaku. Sobre atingir o estado de buda nesta existência. 1ª edição São Paulo: Brasil Seikyo, 2009. 108 p. Tradução Elizabeth Miyashiro.
______, Daisaku. Uma paz duradoura. 1ª edição Rio de Janeiro: Record, 1981. 283 p. Volume 1; tradução de Astrid de Figueiredo.
______, Daisaku. Nova Revolução Humana. Volume 1. 1ª edição. São Paulo: Brasil Seikyo, 1994. 227 páginas.
______, Daisaku. Nova Revolução Humana. Volume 2. 1ª edição. São Paulo: Brasil Seikyo, 1994. 218 páginas.
MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas; IKEDA, Daisaku. Astronomia e Budismo: Uma jornada rumo ao distante universo. 1ª edição São Paulo: Brasil Seikyo, 2009. 190 p. Tradução: Getulino Kiyoshi Nakajima.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. 2ª edição São Paulo: Companhia Das Letras, 1995. 476 p.
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. 1ª edição Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006. Biblioteca do Estudante.
SEN, Amartya. A ideia de justiça. 1ª edição São Paulo: Companhia das Letras, 2011. 492 p. Tradução Denise Bottmann, Ricardo Doninelli Mendes.
TOYNBEE, Arnold; IKEDA, Daisaku. Escolha a vida: um diálogo sobre o futuro. 3ª edição Rio de Janeiro: Record, 1995. 346 p. Tradução de: Ruy Jungmann - Choose life.
WICKRAMASINGHE, Chandra; IKEDA, Daisaku. Espaço e vida eterna: um diálogo entre Chandra Wickramasinghe e Daisaku Ikeda. 1ª edição São Paulo: Brasil Seikyo, 2010. 278 p. Londrina, PR: Eduel - Editora da Universidade Estadual de Londrina.

Teses
VIEIRA, Cleber Santos. Entre as coisas do mundo e o mundo dos livros: prefácios cívicos e impressos escolares no Brasil Republicano. 2008. 287 f. Tese (Doutor) - Curso de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.

Revistas
TERCEIRA CIVILIZAÇÃO: Revolução Humana. São Paulo: Brasil Seikyo, n. 523, mar. 2012. Mensal.
TERCEIRA CIVILIZAÇÃO: A paz mundial começa na sua mente. São Paulo: Brasil Seikyo, n. 524, abr. 2012. Mensal.
TERCEIRA CIVILIZAÇÃO: Levantar-se só. São Paulo: Brasil Seikyo, n. 536, abr. 2013. Mensal.
TERCEIRA CIVILIZAÇÃO: Por uma era de paz e humanismo. São Paulo: Brasil Seikyo, n. 537, maio 2013. Mensal. Proposta de Paz do Presidente Ikeda: Compaixão, Sabedoria e Coragem Para A Humanidade Viver em Paz.

Jornais
JORNAL BRASIL SEIKYO: Defendam a Justiça de mãos dadas com as pessoas. São Paulo, 11 set. 2004.
JORNAL BRASIL SEIKYO: Nova revolução humana. São Paulo: Brasil Seikyo, n. 2178, 04 maio 2013. Semanal.



[1] Mestrando em Educação e Saúde na Infância e Adolescência na Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

sábado, 13 de julho de 2013

Marcos Roberto dos Santos[1]

Para descrever essas práticas cotidianas que produzem sem capitalizar, isto é, sem dominar o tempo, impunha-se um ponto de partida por ser o foco exorbitado da cultura contemporânea e de seu consumo: a leitura. Da televisão ao jornal, da publicidade a todas as epifanias mercadológicas, a nossa sociedade canceriza a vista, mede toda a realidade por sua capacidade de mostrar ou de se mostrar e transforma as comunicações em viagens do olhar. É uma epopeia do olho e da pulsão de ler. (CERTEAU, 2012, p. 47)

Sendo um texto de pesquisa positiva o livro “A Invenção do Cotidiano: arte de fazer” Michel de Certeau (2012) apresenta um raciocínio rigoroso onde compreende o desenvolvimento da ação cotidiana. Compondo-se de alguns relatos há a pretensão de narrar práticas comuns. Dedicado ao “homem ordinário”, que é tratado como um herói comum, “ordinário” este no sentido de habitual.
Tendo como objeto de pesquisa o “livro”, como em meu caso, é sempre interessante ter como base, que reforce a bibliografia, autores consagrados como Michel de Certeau, Roger Chartier, Michel Foucault, entre outros que sejam pertinentes ao tema. A proposta de minha pesquisa é olhar para o “livro”, enquanto objeto físico, investigando qual papel/função ele ocuparia na relação entre o leitor e a leitura e sua apropriação da teoria pedagógica, do professor oriental Tsunessaburo Makiguti (1871 – 1944), na sociedade brasileira, diretamente envolvida na construção de um sentido voltado para a educação humanista.
Conforme Chartier (1999)
“O livro sempre visou instaurar uma ordem; fosse a ordem de sua decifração, a ordem no interior da qual ele dever ser compreendido ou, ainda, a ordem desejada pela autoridade que o encomendou ou permitiu a sua publicação”. (CHARTIER, 1999, p. 8)

Para Certeau (2012) “o discurso normativo só “anda” se já houver tornado um relato, isto é, uma lei historiada e historicizada, narrada por corpos”. Ainda complementa dizendo que “uma credibilidade do discurso é em primeiro lugar aquilo que faz os crentes se moverem. Ela produz praticantes. Fazer crer é fazer fazer”. (CERTEAU, 2012, p. 219, 220)
Surgindo assim, que na verdade é o que será investigado, uma cultura e uma representação, vale abordar aqui “A História Cultural: entre práticas e representações” de Roger Chartier (2002) ao dizer que “as representações do mundo social, (...) embora aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as forjam”. (CHARTIER, 2002, p. 17)
Para Chartier (2002) as representações “ela é um dos conceitos mais importantes utilizados pelos homens do Antigo Regime, quando pretendem compreender o funcionamento da sua sociedade ou definir as operações intelectuais que lhes permitem apreender o mundo”. (CHARTIER, 2002, p. 23) As práticas de leitura dizem respeito aos espaços do individual e do social; e que o ato de ler resulta de tensões estabelecidas entre leitores e comunidades de interpretação, assim como dos textos e sua materialidade.
Ainda citando Chartier (1999) quanto ao acesso ao impresso:
“não mais nas sociedades do Antigo Regime do que na nossa, o acesso ao impresso não pode ser reduzido à exclusiva posse do livro: nem todo livro é necessariamente possuído, e nem todo impresso mantido no foro é necessariamente um livro”. (CHARTIER, 1999, p. 24)

Em sua obra “Educação para uma Vida Criativa”, meu objeto de pesquisa, de Tsunessaburo Makiguti, publicado no Brasil em 1994, nos brinda dizendo que a meta da educação deve ser buscar o entendimento do significado e a finalidade da vida e, além disto, a maneira correta de viver.
A ideia da apropriação é entender se a leitura desta obra, bem como a aplicação de sua teoria pedagógica, é introduzida com passividade ou como uma “arte”, conforme comenta também Certeau (2012).
Esta “arte” Certeau (2012) comenta dizendo:
“A esta arte de leitores conviria comparar outras. Por exemplo, a arte de conversar: as retóricas da conversa ordinária são práticas transformadoras “de situações de palavra”, de produções verbais onde o entrelaçamento das posições locutoras instaura um tecido oral sem proprietários individuais, as criações de uma comunicação que não pertence a ninguém”. (CERTEAU, 2012, p. 49)

Assim, saber como os consumidores, ou mesmo os leitores, se apropriam desta obra de Tsunessaburo Makiguti na sociedade brasileira é a base de minha pesquisa propriamente dita. Ainda citando Certeau (2012) é dito que “o sistema escriturístico anda automovelmente; ele se torna auto-móvel e tecnocrático”. (CERTEAU, 2012, p. 206)
Conforme Chartier (2002) “a apropriação, tal como a entendemos, tem por objectivo uma história social das interpretações, remetidas para as suas determinações fundamentais (que são sociais, institucionais, culturais) e inscritas nas práticas específicas que as produzem”. (CHARTIER, 2002, p. 26)
Segundo, ainda Chartier (1999) “as variações das modalidades mais formais de apresentação dos textos puderam, então, modificá-los, assim como mudaram os seus registros de referência e suas maneiras de interpretação”. (CHARTIER, 1999, p. 18)
As formas que são empregadas, as maneiras de pensar investidas em maneiras de fazer constituem um caso estranho – e maciço – das relações que tais práticas mantêm com teorias, tudo conforme dito pelo próprio Certeau (2012) modos de emprego, maneiras de fazer, maneiras de utilizar, ou mesmo reempregadas, “se multiplicam com a extensão dos fenômenos de aculturação, ou seja, com os deslocamentos que substituem maneiras e “métodos” de transitar pela identificação com o lugar”. (CERTEAU, 2012, p. 87)
De acordo com Chartier (1999)
“a transformação das formas e dos dispositivos através dos quais um texto é proposto pode criar novos públicos e novos usos; por outro lado, a partilha dos mesmos objetos por toda uma sociedade suscita a busca de novas diferenças, aptas a sublinhar as distâncias existentes”. (CHARTIER, 1999, p. 22)
Ainda de acordo com Chartier (2002)
“Do mesmo modo que as modalidades das práticas, dos gostos e das opiniões são mais distintivas do que essas obras, as maneiras como um indivíduo ou um grupo se apropria de um motivo intelectual ou de uma forma cultural são mais importantes do que a distribuição estatística desse motivo ou dessa forma”. (CHARTIER, 2002, p. 51)

Conforme Certeau (2012) diz que “as coisas que entram na página são sinais de uma “passividade” de sujeito em face de uma tradição; aqueles que saírem dela são as marcas do seu poder de fabricar objetos”. (CERTEAU, 2012, p. 205) Somando-se a isto podemos citar Chartier (1999) quando diz que “produzidas em uma ordem específica, que tem as suas regras, suas convenções e suas hierarquias, as obras escapam e ganham densidades, peregrinando, às vezes na mais longa jornada, através do mundo social”. (CHARTIER, 1999, p. 9)
Em partes Certeau (2012) comenta que “para ler e escrever a cultura ordinária, é mister reaprender operações comuns e fazer da análise uma variante de seu objeto”. (CERTEAU, 2012, p. 35)
Em A Arte de Ler ou como resistir à adversidade, de Michèle Petit (2009) é comentado que:
“é delicado determinar status da palavra em determinado grupo cultural, em determinada categoria social. Sem dúvida, a necessidade de sentido, de narrativas, o desejo de dar forma à experiência são universais. Entretanto, de um contexto a outro e dependendo da época, não apenas as relações entre o oral e o escrito, as representações do livro e as proibições relativas a esse objeto variam, mas também as formas da narratividade, as funções da palavra e do silêncio tampouco são as mesmas”. (PETIT, 2009, p. 133)

Para Chartier (1999) “o essencial é compreender como os mesmos textos poder ser diversamente apreendidos, manejados e compreendidos”. (CHARTIER, 1999, p. 16) Quando se põe no papel e expõem as ideias, e quando se publicam e exibem suas obras, estudiosos, escritores partilham seus pensamentos e intenções com seus semelhantes, e dessa maneira influenciam a sociedade e a política.
Assim, este mesmo autor comenta que “com efeito, cada forma, cada suporte, cada estrutura da transmissão e da recepção da escrita afeta profundamente os seus possíveis usos e interpretações”. (CHATIER, 1999, p. 105)


Referências bibliográficas
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano: Artes de fazer. 19. ed. Tradução de Ephraim Ferreira Alves. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
CHARTIER, Roger. A Ordem dos Livros: leitores, autores e bibliotecas na Europa entre os séculos XIV e XVIII. Tradução de Mary Del Priori. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. 111p.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações. 2ª ed. Tradução de Maria Manuela Galhardo. Algés, Portugal: DIFEL, 2002.
MAKIGUTI, Tsunessaburo. Educação para uma vida criativa: ideias e propostas de Tsunessaburo Makiguti. Tradução de Eliane Carpenter. 2ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1994.
MATRIZES. Revista do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade de São Paulo. Ano 5, nº 2 (jan./jun. 2012). São Paulo: ECA/USP/: 2012. 304p. 25 cm.
PETIT, Michèle. A arte de ler ou como resistir à adversidade. Tradução de Arthur Bueno e Camila Boldrini. São Paulo: Ed. 34, 2009. 304p.



[1] Mestrando em Educação e Saúde na Infância e Adolescência - Trabalho apresentado à disciplina Estudos sobre Cultura Escolar da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP.

sábado, 22 de dezembro de 2012

NÃO DESPREZEM A EDUCAÇÃO...


Não desprezem a Educação
by Marcos Roberto

A educação é a causa básica para o crescimento de uma nação. Por meio da educação muitas pessoas desenvolverão a capacidade de discernir o bem do mal; sendo educadores é dever de todos, família, professores, auxiliar a preservar os tesouros da educação. Nisto se consiste os esforços para se pavimentar o caminho exato da educação.
Acreditando que a grandeza da educação encontra-se no fato de que se possa conduzir ao caminho da vida futura, de modo que todas as pessoas, sem exceção, possam seguir. Não é um caminho que somente um limitado número de pessoas possa seguir. Dedicar ativamente nossa vida a educação e trabalhar para beneficiar outros é como escalar uma íngreme montanha.
Educação é um grande movimento da humanidade no nível mais fundamental. Infelizmente grande parte dos educadores, para não se dizer todos, são controlados pelo dinheiro. Tomando as palavras de Ikeda  como base podemos dizer que o dinheiro deixa as pessoas loucas; ele possui uma natureza maligna que corrói e destrói o coração do ser humano. Ainda podemos dizer que ser controlado pelo dinheiro é algo miserável. Não podemos perder o espírito de amar a humanidade, bem como de prezar a educação. Ensinar somente assuntos econômicos produz pessoas que são espiritualmente pobres.
Permitindo que seja desprezada a educação estamos falhando em favorecer a injustiça, estamos também nos desviando de nosso caminho como seres humanos. O mundo está em busca de uma educação que sustente o humanismo e que equipare a sua supremacia ao comportamento humano. E, lembremos sempre, para o melhor ou para o pior, o mais importante são as pessoas.
A educação humanista é a chave. A base da educação humanista se encontra na determinação de amar as pessoas como se fossem seus filhos.
Não podemos deixar que menosprezem a educação; aqueles que menosprezam a educação é porque seu coração é desprezível, seu próprio interior mesquinho não lhes permite respeitar os outros.
Sábias palavras as de Ikeda  quando diz que “as escolas são na verdade locais de aprendizado, onde se formam a personalidade e o caráter. Menosprezar seu verdadeiro propósito e transformá-la em locais de portas abertas para os insultos e a violência é algo terrível. Isso nada mais é que o reflexo do estado de Animalidade”. Que palavras verdadeiras para os dias de hoje!
Nós, educadores, só conseguiremos persuadir os outros quando nós próprios formos bons exemplos. A educação consiste em sermos um modelo positivo; se, os educadores, dessem bons exemplos com certeza o país estaria bem melhor. Outro ponto que se soma a isto é mudar a si próprio primeiro e, com essa transformação, mudar o coração dos outros. Goethe disse que somente com ações positivas podemos superar o que é desagradável.
Os verdadeiros educadores consideram seus alunos como mais importantes que seus próprios filhos, que sua própria família. É crucial dedicarmos toda nossa energia à educação, que ilumina as pessoas e as tona sábias, também é o que nos diz Ikeda.
Devemos ter em mente que a educação humanista é a suprema arte e a mais sagrada das profissões. Pois, possibilita que o tesouro de nossa própria vida e da vida das outras pessoas brilhe criando ilimitado valor. E, para se atingir isto, tudo que temos a fazer é nos levantar com a cabeça erguida, com confiança e convicção.

quinta-feira, 14 de junho de 2012


PENSAR SOBRE JUSTIÇA

Marcos Roberto dos Santos[1]


“... a pobreza não é um vício, evidentemente! Sei também que a embriaguez não é uma virtude, o que é para lastimar! Mas a indigência, a indigência é um vício. Na pobreza conserva-se ainda um pouco da dignidade natural dos nossos sentimentos; na indigência não se conserva nada. O indigente nem sequer é expulso a pancadas da sociedade humana; é expulso a vassouradas, o que é muito mais humilhante!”
(Crime e Castigo – Dostoiévski)


O início deste artigo traz o fragmento da grande obra de Dostoiévski, Crime e Castigo, clássico da literatura universal. O fato se dá quando do encontro de duas personagens (Marmieládov e Raskólnikov) em uma taberna. Enquanto conversam e ingerem bebida Marmieládov lamenta-se de sua situação de pobreza. Durante conversa comenta que sua filha se prostitui para ajudar financeiramente em casa - na história a filha tem apenas 16 anos.
Como podemos perceber devido a uma situação de “privação” sua filha está disposta de alguma forma a colaborar com o bem-estar da família. Durante a leitura podemos perceber que a pobreza é tanta que chega a causar desarmonia em seu lar.
No mundo todo 1 bilhão de pessoas sofre com fome crônica. Quantas destas pessoas não se sujeitam a todos os tipos de ofícios para que não vejam sua família em situação deplorável.
Thomas Paine foi uma pessoa de “grande espírito humanitário”, destes que iluminam com rara intensidade a época em que nascem. Viu claramente que “grande parte da humanidade, naquilo que se chama de países civilizados, vive em estado de pobreza e desgraça”. Atribuiu aos governos opressores esse “quadro revoltante da desgraça humana” e afirmou ainda que “a verdadeira grandeza de uma nação se funda nos princípios de humanidade”.
O Prêmio Nobel de Economia em 1998, Amartya Sen, também cita uma experiência sua de infância no livro Desenvolvimento como Liberdade se recordando da seguinte forma:
“Eu tinha uns dez anos. Certa tarde estava brincando no jardim de minha casa na cidade de Dhaka, hoje capital de Bangladesh, quando um homem entrou pelo portão gritando desesperadamente e sangrando muito. Fora esfaqueado nas costas. Era a época em que hindus e muçulmanos matavam-se nos conflitos grupais que precederam a independência e a divisão de Índia e Paquistão. Kader Mia, o homem esfaqueado, era um trabalhador diarista muçulmano que viera fazer serviço em uma casa vizinha – por um pagamento ínfimo – e fora esfaqueado na rua por alguns desordeiros da comunidade hindu majoritária naquela região. Enquanto eu lhe dava água e ao mesmo tempo gritava pedindo ajuda aos adultos da casa – e momentos depois, enquanto meu pai o levava às pressas para o hospital -, Kader Mia não parava de nos contar que sua esposa lhe dissera para não entrar em uma área hostil naquela época tão conturbada. Mas Kader Mia precisava sai em busca de trabalho e um pouco de dinheiro porque sua família não tinha o que comer. A penalidade por essa “privação” de liberdade econômica acabou sendo a morte, que ocorreu mais tarde no hospital.” (SEN. 2010, p. 22)
Kader Mia não precisaria ter entrado em uma área hostil em busca de uns míseros trocados naquela época terrível se sua família tivesse condições de sobreviver de outra forma.
Conforme SEN (ibidem) a privação de liberdade econômica pode gerar a privação de liberdade social, assim como a privação de liberdade social ou política pode, da mesma forma, gerar a privação de liberdade econômica.
SACHS (2005, p. 265) diz que o fim da pobreza exigirá uma rede global de cooperação entre pessoas que nunca se encontraram e que não necessariamente confiam umas nas outras. Com oportunidades sociais adequadas, os indivíduos podem efetivamente moldar seu próprio destino e ajudar uns aos outros.
Estamos em momento de debates pelo encontro de representantes de países pela Rio +20 que acontece no Rio de Janeiro. A convenção tem como temas centrais Economia Verde e Governança Global, entre outros assuntos temos também energia, alimentação e agricultura; emprego e inclusão; cidades sustentáveis; água; oceanos e desastres naturais. De tudo isto se deduz que tem como bem maior a felicidade dos seres humanos. Esperamos resultados positivos.
Em sua Proposta de Paz de 2012 – que encaminha anualmente à ONU – IKEDA (2012, p. 49) é enfático ao dizer que “é indispensável que a formulação das metas considere cuidadosamente questões como a pobreza, a indigência e as desigualdades das condições da vida”.
No Painel de Alto Nível do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre Sustentabilidade Global (2012) é um relatório encaminhado à ONU que em parte diz: “O mundo ainda não está no caminho. Já houve progresso, mas ele não tem sido nem rápido nem profundo o suficiente e a necessidade de uma ação de maior alcance está se tornando cada vez mais urgente”.
O relatório aponta visões de longo prazo que são: erradicar a pobreza; reduzir a desigualdade e fazer que o crescimento seja inclusivo e a produção e o consumo sejam mais sustentáveis.
Em encontro recente (dia 17 de maio de 2012) de cúpulas da ONU em Nova York, o Secretário-Geral da ONU Ban Ki-Moon, fez comentário dizendo o seguinte: “a verdade é que eu estou decepcionado com as negociações. Elas não estão se movendo rápido o suficiente”.
Ainda sobre isso IKEDA, no jornal diário Seikyo Shimbun do dia 26 de junho de 2010 bradou: “a prosperidade da sociedade somente é possível quando proporcionamos proteção, incentivo e força às pessoas”.
Assim, somente podemos pensar em “justiça” quando temos como metas três ideias básicas, de acordo com SANDEL (2012): aumentar o bem-estar; respeitar a liberdade e promover a virtude.
BEM-ESTAR: satisfação com a vida – auto-aceitação; controle sobre o ambiente; vida cheia de sentido; crescimento pessoal; relações sociais positivas e autonomia (empoderamento).
LIBERDADE: ausência de submissão, servidão; elemento qualificador é constituidor da condição dos comportamentos humanos voluntários.
VIRTUDE: é uma qualidade moral particular. São todos os hábitos constantes que levam o homem para o bem, quer como indivíduo, quer como espécie, quer como pessoalmente, quer coletivamente.
Segundo Aristóteles é uma disposição adquirida de fazer o bem, e elas se aperfeiçoam com o hábito.


Referências Bibliográficas
DOSTOIÉVSKI. Crime e Castigo. Coleção a Obra Prima de Cada Autor. Ed. Martin Claret. São Paulo: 2004.
IKEDA, Daisaku. Segurança humana e sustentabilidade: compartilhar o respeito pela dignidade da vida. [Tradução Mariana Ballestero Sales Vieira]. Revista Terceira Civilização. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, 2012.
PAINE, Thomas. Senso Comum. São Paulo: Martin Claret, 2005.
PAINEL de Alto Nível do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre Sustentabilidade Global (2012). Povos Resilientes, Planeta Resiliente: um Futuro Digno de Escolha. Nova York: Nações Unidas.
SACHS, Jeffrey D. O fim da pobreza: como acabar com a miséria mundial nos próximos vinte anos. Prefácio Bono; prefácio à edição brasileira Rubens Ricupero; [tradução de Pedro Maia Soares]. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
SANDEL, Michel J. Justiça – O que é fazer a coisa certa. [tradução 6ª ed. de Heloísa Matias e Maria Alice Máximo]. 6ª edição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.
SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta; revisão técnica Ricardo Doninelli Mendes. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
SEIKYO Shimbun do dia 26 de junho de 2010


[1] Professor e Defensor dos Direitos Naturais do Homem